sexta-feira, 14 de agosto de 2009

O AMOR POIS QUE É PALAVRA ESSENCIAL


Amor – pois que é palavra essencial
comece esta canção
e toda a envolva.
Amor guie o meu verso,
e enquanto o guia,
reúna alma e desejo,
membro e vulva.
Quem ousará dizer que ele é só alma?
Quem não sente no corpo a alma expandir-se
até desabrochar em puro grito de orgasmo,
num instante de infinito?
O corpo noutro corpo entrelaçado, fundido, dissolvido,
volta à origemdos seres,
que Platão viu completados:
é um, perfeito em dois; são dois em um.
Integração na cama ou já no cosmo?
Onde termina o quarto e chega aos astros?
Que força em nossos flancos nos transporta
a essa extrema região, etérea, eterna?
Ao delicioso toque do clitóris,
já tudo se transforma, num relâmpago.
Em pequenino ponto desse corpo,
a fonte, o fogo, o mel se concentraram.
Vai a penetração rompendo nuvens
e devassando sóis tão fulgurantes
que nunca a vista humana os suportara,mas,
varado de luz, o coito segue.
E prossegue e se espraia de tal sorteque,
além de nós, além da prórpia vida,
como ativa abstração que se faz carne,
a idéia de gozar está gozando.
E num sofrer de gozo entre palavras,
menos que isto, sons, arquejos, ais,
um só espasmo em nós atinge o climax:
é quando o amor morre de amor, divino.
Quantas vezes morremos um no outro,
no úmido subterrâneo da vagina,
nessa morte mais suave do que o sono:
a pausa dos sentidos, satisfeita.
Então a paz se instaura.
A paz dos deuses,estendidos na cama,
qual estátuasvestidas de suor, agradecendo
o que a um deus acrescenta o amor terrestre.

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

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